quarta-feira, outubro 11, 2023

Parte do processo civilizador

Essas coisas da História da humanidade Prof. Severino Vicente da Silva (Biu Vicente) Ouvimos histórias, lemos histórias, contamos história, estudamos histórias, história dos homens e das mulheres, a história da humanidade. Nem sempre prestamos atenção ao que nos dizem essas histórias, essas letras, símbolos que nos deixaram os antigos para que as decifrássemos; não as notamos envoltas em sangue e as seguimos contando sem nos apercebermos que as histórias dos humanos sempre foi sanguinolenta. Rios de sangue seguem os conquistadores A história ocorre em constante parto, e no parto há sempre uma quantidade de sangue derramado. São dores de parto, essa nossa história. Esquecemos deste detalhe quando manuseamos um livro de história e encontramos que Ciro dominou a Pérsia; que Hamurabi fez um belo Código de normas para controlar o comportamento dos seus súditos que, segundo ele, dominava os quatro cantos da terra. Mas seu império caiu diante Sargão, o assírio que teve seu reino tomado pelos Medos de Ciáxeres. Sabemos que os gregos derrotaram os troianos e temos, bem claro em nossa memória comum, que um cavalo foi dado e recebido como presente. Sabemos da bravura dos povos do Oriente que não se curvaram ao poder de Alexandre da Macedônia, aquele que pôs fim à rivalidade entre espartamos e atenienses, conquistando-os. E quem é capaz de esquecer que César atravessou o Rubicão após derrotar gauleses Poderíamos continuar contando os sucessos dos generais e dos império e, nem imaginamos o sangue vertido, o sofrimento sentido. Foram séculos de guerra permanente na formação dos povos que chamamos ocidentais e, sabemos que também rios de sangue foram base dos sucesso dos reis do povos orientais, chineses, mongóis, japoneses e outros tantos. A humanidade vive em dores de parto, teria escrito Paulo de Tarso; a história é um vampiro, alimenta-se de sangue humano, escreveu Michelet. A guerra e tudo que lhe acompanha: o medo, o terror, a fome, a tortura, o abandono, a morte, foi o comum na existência da humanidade que, em todos os continentes e culturas sempre procurou alternativas ou justificativas para esse comportamento dos animais que se disseram sapiens. Se a descoberta da metodologia de fazer o fogo a qualquer momento foi crucial no processo de ampliar o espaço para a caça com os outros animais, com a agricultura, em seguida, veio o disputa com outros grupos de homo sapiens e, temos a invenção da guerra. Da busca por terra e seu controle, tudo veio a ser permitido. Aqui e acolá algumas normas foram sendo elaboradas para garantir a sobrevivência do grupo, de tal forma que ele fosse capaz de enfrentar outros grupos. Hamurabi, Gilgamesh, Moisés, Ciro, Dracon, Solon, Confúcio e outros estabeleceram normas de conduta. Mas a absorção de tais normas eram em sua maioria voltada para garantir a a coesão e sobrevivência de cada grupo, comunidade, tribo, etc. As guerras eram impiedosas, assim como os castigos aplicados aos que feriam as normas. As penas sempre foram maiores que os crimes cometidos. É com Cesare Beccaria (17h38-1794) que tem início um processo mais comedido na aplicação das sentenças, com os homens criando as suas leis e, não apenas seguindo as “leis que foram ditadas por alguma divindade”. Quanto ao comportamento nas guerras, as gravuras que noticiam a Guerra dos Trinta Anos, na Europa seiscentista, dão mostra de que os soldados, que trabalhavam por saque, agrediam a todos indistintamente, sem controle. As chamadas ‘árvores dos enforcados’ são a demonstração da ação dos reis em busca de controlar seus soldados. Mas isso foi sendo conseguido aos poucos, com a criação dos exércitos nacionais, o que diminuiu em muito a violência contra os civis. A violência dos homens armados contra grupos humanos sem armas ou com armas de menor efeito, levou ao massacre e genocídio dos povos e nações do dito Novo Mundo, de nações asiáticas e africanas entre os séculos XVI e XX, período que Norbert Elias diz ter havido, na Europa Ocidental, um Processo Civilizatório, um processo de contenção, de controle social, de modo a permitir a sobrevivência social. Esse controle da violência, que garante a vida em sociedade, nem sempre tem sido apreciada pelos críticos da ‘civilização ocidental’, uma vez que a sua civilidade parece ser favorável apenas aos, povos ocidentais. Mas foi ainda no século XIX que ocorreu a Primeira convenção de Genebra (agosto de 1864) para debater o comportamento dos exércitos no cuidado com feridos, definir a proteção à população civil, além da criação da Cruz Vermelha. Outros Tratados, no total de quatro) realizados em Genebra ampliaram a legislação e proteção dos combatentes e não combatentes. A reunião de Haia (1899) com a participação do brasileiro Rui Barbosa; a reunião de Genebra (1914) com a participação de Epitácio Pessoa, e em 1949, com a participação de Osvaldo Aranha, são parte desse processo civilizador que pretende minorar os efeitos colaterais da guerra. Mas a realidade anda mais rápido que os legisladores e a absorção dos ideais que nascem da criação de utopias. Esses tratados são respeitados pelos 196 países signatários, aqueles que não assinaram não sente a obrigação de o fazer. Alguns preferem a barbárie, pois a civilização estabelece limites que impedem o comportamento puramente animal e aponta para a convivência com os que pensam diferente. Ouro Preto, Olinda. 11/10/2023