terça-feira, novembro 13, 2007

Relações Escolas e Ponto de Cultura - 2

Este é o segundo bloco de uma palestra com o título acima

3. a separação dos saberes
Entretanto ocorreu a separação entre os saberes e, o saber ficou sério e perdeu a alegria da dança, do riso, das canções. Essa divisão não ocorreu apenas em nossa sociedade, esta que vem sendo criada desde o Renascimento Cultural europeu, mas foi nela que a separação tornou-se dramática e pôs fim ao prestígio que os pontos de cultura tinham até então. A seriedade da lutas religiosas impregnou os saberes e os modos de vida das populações. A popularização dos livros fez com que os conhecimentos escritos passassem a ter mais validade que os conhecimentos obtidos de maneira mais auditiva, mais passiva; aquilo se aprendia fora da escola passou a ser visto de maneira negativa e foi se formando uma sociedade que desconfiava do conhecimento que o povo que não podia participar da escola possuía. A escola que se formou desde então é uma escola que não quis ser apenas mais ponto de cultura, mas ser a definidora do que é cultura. Como não foi possível impor a todas as camadas da população a mesma escola, os mesmos conhecimentos, passou-se a ver os conhecimentos adquiridos foram da escola como não sendo cultura. Cultura ficou sendo o conhecimento verdadeiro, os demais eram falsos, superstições. Cultura passou a ser aquilo, aquelas coisas, aqueles saberes que estão contidos nos livros.
Mas logo se percebeu que não se pode ensinar todas as coisas, todos os saberes nas escolas, uma vez que as escolas deveriam ser os locais onde se aprende o que realmente interessa para o mundo do trabalho na cidade. Sim, a escola é uma instituição que pressupõe a cidade. Os saberes que ela transmite são aqueles saberes necessários para a vida urbana que vem se organizando desde o Renascimento cultural europeu, o renascimento de uma cultura urbana, que pretende ser separada dos espaços rurais, embora seja dele dependente. A nova cultura que vem se formando e sendo valorizada desde então supõe a desvalorização do mundo cultural anterior. Assim ocorreu durante alguns séculos.

4. a escola é parecida com a corte
A secularização da cultura deu os seus primeiros passos no Renascimento ocorrido na Península Itálica, mas foi na França e Inglaterra dos séculos XVII, XVIII e XIX que ele se formalizou. Os esforços de alfabetização das populações e a utilização de novos modos de viver, de andar, de falar, de comportamentos na vida social, tomaram como parâmetros a cultura francesa, o jeito francês de ser educado, o jeito francês de se conduzir e ser conduzido na sociedade. A cultura passou a ser entendida como aquilo que homem educado possui, e o que ele possui ele recebeu da e na escola. Culto passou a ser o homem que freqüentou a escola, possui livros, lê livros e, em alguns casos, escreve livros. Aliás, é interessante como as pessoas escrevem livros sobre os outros, sobre os que não sabem ler e escrever, desde o séculos XVII. Homens e mulheres cultas da Europa vieram ao Brasil no século XIX e ainda hoje as suas observações são muito respeitadas. Os homens e mulheres cultas dos dias atuais chamam esses andarilhos de cronistas viajantes.
Os franceses e ingleses foram os primeiros que organizaram sistemas de ensino escolar e discutiram que o novo mundo que estavam construindo seria um mundo de Igualdade, Fraternidade e Liberdade. Puderam impor o seu modo de entender o mundo aos demais povos, através de suas armas, da tecnologia que criaram, utilizando as invenções herdadas das tradições de muitos outros povos. Ser culto, ter cultura passou a ser sinônimo de ser francês ou inglês. Reagindo a isso, alguns alemães procuram reavivar as suas tradições, aquilo que os fazia diferentes dos ingleses e franceses. Eram as suas histórias, o seu idioma, as suas crises, as suas dúvidas. Encontraram-se naquilo que não havia sido apagado pelo avanço das Escolas Dominicais de Igreja Luterana, nem pelas escolas do príncipe Frederico Guilherme II. Mas nem todos os povos tiveram, puderam ter os seus Herder, Goethe e Kant. E por conta disso, durante muito tempo, no Brasil, nem tivemos escolas nem deixamos que surgissem pontos de cultura.

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