quarta-feira, março 05, 2025
AS CINZAS DE UM CARNAVAL
As Cinzas de um carnaval
Prof. Sverino Vicente da Silva – Biu Vicente
Mais um carnaval vivido e, eles nos indicam o quanto já vivemos, o quanto passamos com eles o tempo em suas diversas etapas. Cada carnaval tem suas canções e, os que se deleitam nos movimentos dos corpos e das partituras, as reconhece. Contudo há algumas canções que permanecem e enfrentam os carnavais. Jovens do vigésimo quinto ano do século XXI, cantam animadamente as canções seculares, vestem-se de jardineiras em uma época de muito cimento e poucas flores nos jardins públicos. Alguns carnavais sempre revivem com o Abre Alas da primeira maestrina que fez esta, que se pode chamar de primeira canção de carnaval, à pedido do Bola Preta, que continua a ocupar espaço no centro do Rio de Janeiro, agora tomado pelas escolas de samba, uma criação paralela às escolas nas quais eles, foliões pobres e pretos não tinham acesso. Enquanto isso, no Recife aristocrata e conservador, que permitia o cortejo da corte do maracatu, perseguia os capoeiras que, acompanhando as bandas musicais da polícia, esconderam o corpo guerreiro para surgisse o corpo bailarino, protetor das mulheres que iam brincar na rua, formando blocos. Esses blocos permanecem e, a cada ano, comemora-se o centenário de algum deles. E os mais jovens os seguem, quase sempre sem perceber a história de rebeldia e negociação social que cada um viveu para nascer. Já não existem, fisicamente, os centenários fundadores, eles são esses rapazes e moças que, nas estreitas ruas da Olinda gestada antes do século XX, os continuadores da tradição e fundadores dos novos blocos e clubes. O mesmo ocorre no Recife do frevo e do maracatu, na Goiana dos Caboclinhos, em Nazaré da Mata com a Festa dos Caboclos tornada Maracatu de Baque Solto, desde o final do século XIX. Aliás, nunca é demais lembrar que, no século XIX floresceu Pernambuco, antes do Brasil, pois, como disse Saint Hilaire, “havia um país chamado Brasil, mas não havia brasileiros”. Nas cinzas do dia 5 de março, padece mais um carnaval que nunca morrerá enquanto Pernambuco houver.
Durante o carnaval os que estão se tornando brasileiros, receberam mais um dado, uma realização, uma vitória. A decadente sociedade estadunidense colocou o mais cobiçado troféu de sua indústria de cinema nas mãos de profissionais que atuam na periferia do centro financeiro do atual império, atualmente dirigido por uma pessoa que julga ser uma potência do século XIX e, embevecido pela aeoria do “fim da História, não leu a Decadência do Ocidente.
Walter Salles, Fernanda Torres, Dalton Melo e toda a equipe, fez o relato de Marcelo Paiva ser uma avenida para indicar que o centro cultural está mudando de endereço. O percurso ainda é longo, mas a história que é construída no cotidiano das pessoas, é mais notada, se a vermos como parte de um processo. Durante o carnaval, na madrugada do primeiro dia houve mais uma razão para “perder” a razão. Soubemos ganhar o título sem chorar pelo que foi “perdido”, e isto é muito importante para a nossa formação. Por outro lado, pudemos verificar que há, habitantes do Brasil que jamais deixaram de glorificar a terra da qual foram expulsos, e também parece que nunca amarão quem os recebeu de braços abertos, ainda que sacrificando parte da população indígena; esses nascidos no Brasil, mas com alma de europeu do final do século XIX, lamentaram a vitória do povo brasileiro que ganhou seu primeiro Oscar. É que no encontro carnavalesco, também há os palhaços, trágicos como os da ópera italiana.
O carnaval apresenta um modelo de sociedade, um modo de ver o mundo e viver com os demais seres, humanos ou não, mas sempre alegres. Enquanto anunciava-se esse novo mundo, os filhos do “admirável mundo novo” organizavam-se para a guerra, com soberbos humilhando outros, estes com menos poder e, para seu sofrimento, descobrir que o grande aliado aparece como grande inimigo. Estados Unidos da Amárica do Norte, Rússia demonstram desprezo e, os traídos – Ucrania, Alemanha, França, Reino Unido – descobrem-se pobres e impotentes como os povos que “civilizaram”.
Esta Quarta-Feira de Cinzas aponta para o que somos.
Ouro Preto, Olinda, 05 de março de 2025.
Prof. Severino Vicente da Silva – Biu Vicente.
Membro do Instituto Histórico de Olinda; membro Honorário do Instituto Antropológico, Geográfico e Histórico Pernambucano.
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