segunda-feira, junho 30, 2008

poesias e danças do mês de junho

O período junino parece ser adequado para a reflexão sobre alguns comportamentos culturais de nossas populações. Aproveitei parte da semana central dessa festividade para visitar algumas localidades de nosso Estado, um pouco com o objetivo de verificar como anda o cultivo das tradições juninas. Parece ser ponto comum dizer que essas tradições estão mais vivas no Brasil mais antigo, o Brasil do Nordeste, o Brasil que se formou desde as primeiras migrações européias para essa terra. Festejos populares relacionados com a colheita, a celebração da natureza. Esses festejos mesclam tradições de origens luso-medievais, indígenas e algumas africanas. E todas ligadas ao à terra, à sociedades agrícolas pré-modernas. Mas a maneira de festejar que temos nos dias de hoje vem sendo criada no século XX, como nos atestam danças como xote, xaxado, xamego, baião, todas ligadas ao nome de Luiz Gonzaga, cantor nordestino que ganhou o Brasil a partir do bairro de São Cristóvão, Rio de Janeiro. Também outros, como Jackson do Pandeiro, com seus cocos, emboladas têm contribuído para a criação, recriação e manutenção de um Nordeste idílico. Esse é o Nordeste que tem sido aproveitado por algumas cidades para atrair turistas em busca do idílico Nordeste e dos encontros etílicos.
As danças, os ritmos, os vestuários modificam-se com o tempo e com as mudanças sociais. O Nordeste idealizado nas músicas e ritmos popularizados pela sanfona de Gonzagão não pode deixar de sofrer mudanças, tendo ele várias vezes anunciado sua despedida quando diminuía a demanda por suas apresentações e sua música. No final de sua vida ocorreu um “revival” que permanece até hoje em alguns lugares, cidades que se organizam para a recepção de turistas em busca de um Brasil que já não mais existe. Simultaneamente, ocorre a miscigenação, a hibridização, a mistura de ritmos novos, criando novos mercados musicais. O mundo do espetáculo chegando ao mundo do Forró. Bandas profissionais unem ritmos de diversas partes do país – Pará, Pernambuco, Ceará, Bahia – e estabelecem-se em quase todas as praças, tocando melodias simples, frases soltas, simplórias, com atrativos sensuais e sexuais. Ganham audiências cada vez maiores porque não temem utilizar os apelos ao que Bakhtin analisa como os espaços inferiores do corpo, tão expostos no mundo de Rabelais e tão reprimidos no mundo de Calvino e da rainha Vitória.
Em rápida passagem por algumas cidades pude verificar que, se no Recife triunfou o Forró tradicional, dito de Pé de Serra, com Sanfona Triangulo e Zabumba, em cidades das regiões Metropolitana, Mata Norte e Mata Sul, ocorreu o domínio das chamadas bandas de Forró Estilizado, como mulheres semi-despidas experimentando os limites das possibilidades de flexibilidade dos corpos, com cantores cantando as desgraças da vida amorosa sendo aclamados pelo público. Devemos pensar por que tais ocorrências.
Alguns podem dizer que é uma questão de educação, e pode ser verdadeiro dependendo da elasticidade que esteja sendo dado a esse conceito; outros poderão dizer que por conta do poder dos meios de comunicação – rádio e televisão - que parecem recusar espaço para artistas que não cedem espaço poesias deficitárias de beleza e imaginação. Pode ser que esteja ocorrendo uma retro-alimentação cultural. Talvez, como a sociedade deixe tão pouco para que o indivíduo pense sobre si e sua vida, só lhe resta pensar e buscar satisfazer-se com os prazeres das partes inferiores.
Tenho, temos, que pensar mais sobre essas ocorrências.

segunda-feira, junho 23, 2008

A batalha da Chã de Camará

Neste período da festa da colheita do milho, momento em que tradições geradas no Brasilo mais antigo, dessas tradições que, criadas ainda no período de dominação portuguesa, se renovam na criatividade das novas gerações dos tempos performáticvos e espetaculares, também é momento de refletir a expansão menos vista, a expansão da consciência de si e para si que ocorrem em pequenos setores sociais. Da mesma maneira que as tradições populares juninas são renovadas, as esperança dos mais pobres também se faz nova, distante dos que pretendem colocar a história nos limites dos seus projetos, relutando a compreender que a vida iniciada é vida que se recusa a ser preada.

Nesses tempos em que todas as movimentações de protesto ou de apoio às autoridades e suas políticas, surpreendeu-me o telefonema de um morador da Chã do Camará, no sábado 7 de junho, dizendo que não fosse, como faço cada sábado, no Ponto de Cultura do Maracatu Estrela de Ouro de Aliança. A pessoa pediu que também avisasse às universitárias que, a cada sábado conversam e fazem artesanatos com as mulheres da vizinhança, brincam com as crianças e auxiliam na compreensão dos trabalhos escolares. Se tentássemos ir não conseguiríamos chegar à Chã de Camará. A PE 62 estava interditada desde a véspera. Nada mais disse.
Cumpri as orientações e fui ler os jornais. Em um deles estava escrito que a comunidade de Chã de Camará, havia interditado a referida rodovia depois que uma caminhonete, dessas que são compradas com cifras próximas a cem mil reais, passando a grande velocidade, atropelou, matou, uma senhora octogenária da vizinhança, não parou para dar assistência. Essa atitude de um desses guardadores de dinheiro e passam a vida tratando gente como gado, promoveu a ação das mulheres da comunidade. Só depois é que os homens da comunidade assumiram. "quando fomos dormir, de noite, os homens ficaram tomando conta."

A morte daquela mulher não incomodou o assassino motorizado e não molestaria a ninguém, pois a morte dos pobres a ninguém incomoda. Mas quando as mulheres carregaram toras de coqueiro, conseguiram pneus e obstruíram o trânsito na rodovia que faz a ligação entre muitas cidades, e os ônibus foram obrigados a parar e as kombis foram obrigadas a parar próximo ao trevo de Upatininga muitos foram incomodados. Vieram as autoridades para forçar as mulheres desobstruir a rodovia. Elas disseram que só sairiam quando fossem postos controladores de velocidade – as lombadas - para evitar novas mortes. Promessas foram feitas que, se elas desobstruíssem a rodovia eles iriam construir as lombadas. Disseram que elas estavam importunando a vida de muitas pessoas. As pessoas que foram obrigadas a abandonarem os carros e andarem a pé diziam que o que elas estavam fazendo não traria de volta a vida da mulher atropelada. Elas disseram que pretendiam evitar que outras caminhonetes tirassem outras vidas. A rodovia ficou interditada por mais de vinte e quatro horas. Não havia nenhum desses movimentos especializados em invadir espaços públicos. Foi um movimento espontâneo da comunidade que está crescendo e sentindo-se atemorizada por motoristas de automóveis que, a grande velocidade, ameaçam de morte os seres humanos que não possuem automóveis.

Quando fui a Chã de Camará, neste sábado, vi que as lombadas estavam postas. Conversei com a pessoa que me telefonara. Descobri que a notícia saiu no jornal porque a comunidade telefonara para os jornal; as rádio de Aliança, Goiana e Nazaré da Mata informaram sobre a ocorrência porque a comunidade telefonara para as rádios alertando à população para o que estava ocorrendo e que evitassem passar por aquele caminho enquanto não fosse construídas as lombadas requeridas pela população local. Interessante é que, tendo sido construídas as lombadas, a comunidade telefonou para as emissoras de rádio agradecendo o serviço que elas prestaram. Aquela pessoa que contou-me todas essas ocorrências ainda está estudando para terminar a escola fundamental, tem cerca de vinte e três anos e seu filho mais velho está com sete anos. Ela disse “se a gente não estiver organizado e fizer o que é necessário para a gente, a gente nunca vai ter nada porque eles só se preocupam com eles”. Disse essas palavras sorrindo a alegria de uma vitória inimaginável, por ela e pelas outras mulheres, poucos anos atrás. Uma cidadã se afirma quando age na produção de seu futuro e o futuro de sua comunidade.

e eu feliz com a vitória das mulheres na Batalha do Trevo da chã de Camará.

Em tempo: Sábado, dia 28 de junho, tem festa de São Pedro no Ponto de Cultura Estela de Ouro Estrela de Ouro. Chã de Camará, quilômetro 7 da rodovia PE62. Início às 19 horas.

terça-feira, junho 17, 2008

Um humanista é capaz de ver além da simples aritmética

Estou colocando estas palavras escritas pelo jornalista Hélio Fernandes para que não sejam esquecidos, mas lembrados, acontecimentos que já vivemos. Hoje, pessoas que lutaram para destruir o povo brasileiro estão juntas de outros que estão se construindo ao tempo que põem em segundo ou terceiro plano a criação permanente do Brasil. Crescer economicamente é crescer economicamente, criar escolas apenas com o objetivo de garantir funcionamento de indústrias não é humanismo, e maquinismo. Fazer simplesmente crescer a BVF e a Bolsa Família não fazer crescer a consciência das pessoas. Como disse, algum tempo passado um poeta “a gente não quer só comida”

“Na ditadura, processava jornalistas na polícia, mandava dar surras em homens como Oliveira Bastos, era o dono de tudo. Hoje é o "queridinho" da mídia.
Pouco antes da explosão da maldição do AI-5, já se sabia que o regime endurecera. Desde 1965/66 (1964 só vale pela tomada do Poder, quase sem objetivo ditatorial) se travava dura luta entre os que queriam mais ditadura e um grupo sensato, que achava que o regime autoritário não deveria nem poderia durar muito. Por mais surpreendente que possa parecer, Costa e Silva tentava conter os mais exaltados.
Um civil e um militar estavam entre os que consideravam que as coisas estavam muito "doces e suportáveis". Eram o major Passarinho e o ministro da Fazenda, Delfim Netto. No momento, só este me interessa.
Hoje tido e havido como "democrata", leiam e relembrem a ameaça de Delfim contra jornais e jornalistas, genérico, sem explicitação. (Isso em 1967, 1968 e seguintes).
Textual: "O governo vai processar os jornais que vêm alarmando o País com boatos infundados sobre aumento do dólar".
E a seguir: "Não podemos tolerar esses abusos, tomaremos medidas enérgicas para acabar com esses boatos, recorreremos até a processo policial". Não falou em processo judicial ou jornalístico. E está aí, prestigiado, depois de 3 vezes ministro da ditadura. Um autêntico democrata. » (Tribuna da Imprensa, RJ, 16 de julho 2008)

Precisamos de técnicos, mas será bem mais interessante se eles forem humanistas de verdade, comprometidos com valores maiores que os de suas contas bancárias.

segunda-feira, junho 16, 2008

Um mestrado e um livro



Estive fora nos últimos dias. Primeiro foi uma viagem há muito desejada, um retorno a um lugar do passado que sempre esteve presente e, simultaneamente criando novos laços. Caxias do Sul, na serra gaúcha estava com temperatura em média de 8 graus. Dessa vez para assistir a defesa da dissertação de mestrado de minha filha caçula, Tamisa, a respeito dos festivais de ciranda que ocorreram nos anos sessenta do século passado. Ela fez uma análise do impacto provocado, por aqueles festivais, em um brinquedo popular que alcançou os espaços sociais da capital pernambucana.


A viagem foi um permanente deslocamento, pois saí na madrugada da quinta feira e retornei na tarde do sábado. À noite foi a festa do lançamento do nosso livro mais recente MARACATU ESTRELA DE OURO DE ALIANÇA: A SAGA DE UMA TRADIÇÃO, que ocorreu no sábado, na livraria cultura.


Foi muito interessante ver um caboclo de lança passeando por entre as estantes da livraria. No auditório tivemos o Terno tocando para acompanhar os versos do Mestre Zé Duda; a palavra do produtor cultural e um dos idealizadores da Trilogia da Mata, Afonso Oliveira; as palavras do Mestre Luiz Caboclo, o organizador das coreografias apresentadas pelo Maracatu Estrela de Ouro de Aliança e, também o presidente do Ponto de Cultura Estrela de Ouro. Também eu disse algumas palavras sobre o significado do livro, uma pequena exposição do processo de pesquisa, escrita do livro. O auditório esteve com quase todos os assentos ocupados e isso nos fez feliz a todos. Foi um final e um início de semana muito bom.

As pessoas podem adquirir o livro na Livraria Cultura, na livraria do Centro de Filosofia e Ciências Humanas da UFPE, ou na minha sala, no 11º andar do CFCH, ao preço R$15.00.

domingo, junho 08, 2008

Regras limitam vocações autoritárias

Vivemos nesse mundo sempre ligados a regras. Em um outro mundo, em uma outra vida não sabemos quais regras lá existem. É certo que as religiões que procuram organizar a vida nesta existência têm indicado regras que procuram garantir uma boa vida na outra vida. Ou seja, as sociedades sempre estabeleceram regras de convivência, regras para garantir a sua existência e a convivência dos seus membros. Houve um tempo em que os que estavam no poder faziam, eles próprios, as leis. Às vezes diziam que eram deuses, outras vezes diziam que o faziam em nome de alguma divindade. Mas era comum que esses que estavam no poder utilizassem os gumes das espadas, para garantir que a vontade das divindades fosse obedecida. Quase sempre as divindades concordavam com a vontade dos governantes. Assim é em alguns lugares ainda hoje. Tem gente que conversa diretamente com alguma divindade e ela o orienta no que fazer. Tem gente que acredita e “faz tudo que o Senhor Rei mandar”. Os escravos que cuidavam das caldeiras dos engenhos sabiam muito bem porque as crianças brincavam de “boca de forno”. Também era assim, diz o livro das Crônicas, no tempo de Nabucodonosor que mandou três jovens para a fornalha. Aqueles jovens tiveram mais sorte que Lourenço no Império Romano, bem como os hereges e bruxas nos impérios dos cristãos do medievo e da Idade Moderna. Conta-se que os anjos não permitiram as chamas tocarem em Misael e seus colegas. Mas eles foram levados à fornalha por não desejarem cumprir as ordens emanadas da vontade do rei.

Uma das características de nossa incompleta democracia é que, entre uma fogueira e outra, os grupos sociais foram quebrando as razões dos poderes absolutos dos governantes que utilizavam o nome das divindades para impor suas vontades. Desde o século XVII que as sociedades ocidentais passaram a estabelecer limites à volúpia dos poderosos. Foram sendo estabelecidas constituições, parlamentos, leis escritas que garantissem o mínimo de segurança contra a vaidade e egocentrismos dos que estão no poder, agora não mais pela vontade das divindades, mas pela vontade expressa da população daquele país. Sempre é possível melhorar essa maneira de convivência, mas também sempre é possível piorá-la.

Começa a ser discutida, no Brasil, uma maneira de se aplicar a quem pretende governar um município, estado ou o país, o mesmo que se exige de um cidadão comum para que ele assuma um cargo público: mesmo que ele tenha sido aprovado em concurso público, ele precisa não ter processos contra ele. Se assim fosse feito, alguns estados teriam outros governadores e os parlamentos estariam com outra conformação, uma vez que cerca de trinta por cento de deputados estão encrencados na justiça e não podem ser julgados por serem deputados. Serão julgados quando morrerem e não puderem ser eleitos.Até lá, alguns criminosos continuarão a criar as leis que controlam gente honesta,

Uma das prática mais nojentas da nossa política era que os que estavam em cargos executivos utilizavam aquela posição para beneficiar algumas setores em troca de votos. Para evitar isso, foi estabelecido que, em período eleitoral, as verbas não podem ser liberadas. Não resolve todo o problema, mas inibe a prática se algum desonesto estiver no poder. Pos bem, tem gente que acha que está acima da lei e das tentações que sofrem os seres comuns. Assim pensavam os reis absolutistas e os ditadores fascistas. Outros poderiam errar, ceder às tentações, não eles.Sabemos que cada um de nós tem uma tendência de nos acharmos perfeitos, impossibilitados de errar. Uma das coisas boas da democracia é que a lei é feita para ser cumprida por todos, inclusive eu, você.

Entretanto, hoje no país, tem alguém que acha que as leis estão erradas e ele está certo, completamente certo e sem possibilidade de errar. Ele acredita nisso, o que é até compreensível; preocupante é que tem gente que acha isso mesmo. Bem, esse candidato a excelso filho do Excelso, disse a seguinte frase esta semana: A eleição nesse país, ao invés de consagrar a democracia, faz quem governa ficar sem governar porque o falso moralismo parte do pressuposto de que assinar contrato com um prefeito é beneficiar o prefeito. É o lado podre da hipocrisia brasileira. (Prsidente Luiz Inácio da Silva, 4/6/2008)

Talvez a nova encarnação do divino tenha razão, mas podemos perguntar: sabendo da existência da lei por que os contratos não podem ser assinados antes do período que a lei proíbe; também devemos lembrar que não se governa apenas em período eleitoral, mas todo o período de governo. Mas, o que mais me intrigou nesta revelação da verdade é a definição de “o lado podre da hipocrisia brasileira”. Essa frase revela que há um lado podre e um lado bom da hipocrisia. Imagino quando será nos dada a revelação de qual é o lado bom da hipocrisia brasileira. Deve ser a praticada pelos santos que foram proclamados inocentes por todas as Comissões Parlamentares ( ou Para Lamentares) de Inquéritos.

Tomara que o retorno do ensino da filosofia no ensino Fundamental e Médio auxilie a nossa sociedade a voltar a pensar. Todos estamos esperando que os filósofos comentem esse ensinamento do presidente. Filósofos pensam sem permissão. Correm os riscos das labaredas, mas é o preço de ser.
Como diz Millor: livre pensar é só pensar.

quarta-feira, junho 04, 2008

Malunguinhos de Catucá e Caboclos da Chã de Camará




  1. O transcorrer dos dias nos trazem muitas surpresas, inclusive porque cada dia é uma surpresa, nunca o havíamos vivido. Cada dia é uma maravilha de novidades escondida no que nos parece cotidiano. Ontem, tive um encontro interessante. Sílvio, que trabalha como ascensorista aqui no CFCH, apresentou-me uma senhora que estava procurando o professor Severino Vicente, pois ela queria comprar o livro Estela de Ouro de Aliança. Este fato já foi uma alegria enorme. Levei-a até a minha sala e entreguei-lhe o livro. A alegria cresceu quando a vi juntar cédulas de um e dois reais para completar os quinze reais. Disse-lhe que já era suficiente quando ela chegou aos doze. Mas ela fez questão de alcançar a cifra de quinze reais. Perguntei por que ela queria o livro e ela disse que gostava do que eu escrevia e iria dar o livro como presente para alguém, depois de lê-lo. Todos que somos autores sabemos a alegria que isso nos causa e a responsabilidade.

    Por conta dessa responsabilidade, hoje voltei a ler LIBERDADE, o excelente livro de Marcus Carvalho sobre o Recife do século XIX. A leitura, releitura, desse livro é indispensável para a escrita do meu próximo livro, também uma imposição do Maracatu Estrela de Ouro, sobre os caboclinhos de Goiana. Além de nos mostrar como era o cotidiano do Recife, Marcus nos envereda no mundo criativo do Brasil. Não estou falando do Brasil criativo, mas da criação do Brasil. Ela comenta como a Jurema Sagrada, culto dos nossos ancestrais indígenas assimilou a luta dos escravos no seu panteão. Mas não na sua forma africana, MALUNGO, que significa companheiro, mas na forma brasileira MALUNGUINHO, como a nos dizer que houve não uma aceitação do africano, mas uma criação nova. Ver transcrever o que diz um dos maiores historiadores vivos deste Pernambuco.


Todavia, o emprego da forma diminutiva do termo “malungo” – Malunguinho é o nome do chefe – é um indício de um processo de transformação cultural bastante dinâmico. Há muito notou Sérgio Buarque de Holanda, que o “inho” é um traço característico do falar rural brasileiro. Malungo, portanto, é um termo banto, mas malunguinho é uma derivação plenamente brasileira crioula. (...) esse abrasileiramento é uma expressão própria da reconstrução da nova identidade americana representada pelo quilombo, onde todos são eram apenas malungos, mas malunguinhos.

Da mesma forma que encontro o Caboclo Malunguinho no Centro Nossa Se nhora da Conceição na Chã de Camará, o encontro nas tribos de Caboclinhos.

Que bom que Dona Maria veio comprar o livro Estrela de Ouro de Aliança – a saga de uma tradição. Ela me lembrou que sou malunguinho, como ela também o é, Por isso, penso, ela gosta do meu livro: é a história dela, de malunguinhos como ela, não africanos, mas brasileiros.


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CARVALHO, Marcus J. M. Liberdade, rotinas e rupturas do escravismo . Recife, 1822-1850. Recife: Editora Universitária UFPE, 1998.

SILVA, Severino Vicente da. Maracatu Estrela de Ouro de Aliança, a saga de uma tradição. Recife: Editora Associação Reviva, 2008.