sexta-feira, outubro 12, 2007

Conquistando cidadania e respeito: Chã de Camará e Sebastião Grosso

Acabei retornar da cidade de Nazaré da Mata, onde fui encontrar-me com três estudantes (duas de Geografia e uma de História) que irão participar da Usina Cultural, um projeto do Ponto de Cultura Estrela de Ouro. Essas jovens irão, a cada sábado, promover ações envolvendo as mulheres do Sítio Chã de Camará e sua vizinhança. Ainda na tarde de ontem, enquanto mantinha uma reunião com o Griô Biu do Coco e Cleide, os jovens e adultos do Sítio Chã de Camará, com a a supervisão de Afonso Oliveira, cuidavam de colocar canos, bombas e bóias para suspender o tradicional carretel que é utilizado para, com uma corda e caneca, retirar água de um poço de vinte sete metros de profundidade. Às nove horas da noite, enquanto eu estava conversado com as estudantes na Faculdade de Formação de Professores de Nazaré da Mata, recebi uma ligação telefônica informando que agora a Chã de Camará não precisará mais utilizar um método de captação de água próprio do início da colonização do Brasil. O banho agora será no chuveiro e teremos mais higiene na comunidade.

Essa alegria de assistir a promoção da cidadania e o crescimento da estima da população da Chã de Camará, local de fundação do Maracatu Estrela de Ouro, local de formação de mestres da cultura popular da Zona da Mata Norte, ficou um pouco triste por conta da notícia da morte de Sebastião Grosso. Esse homem que passou toda a sua vida na cidade de Goiana, trabalhando no campo e no mercado local, mantinha em sua casa um centro de produção cultural, de manutenção das tradições de seus antepassados. Sebastião Grosso era um grande coquista, um produtor de canções; ele animou a vida de muitos dos habitantes de Nova Goiana, um bairro na periferia da cidade. Com sua casa à disposição da comunidade, Sebastião Grosso cuidava dos desejos da alma e dos corpos dqueles que o procuravam. Ano passado, no Festival Canavial, realizado na cidade de Nazaré da Mata, Sebastião cantou pra um público que sempre pedia mais um verso, mais um coco. Alumbravam-se, as pessoas, com a voz rouca e os versos alegres, debochados do poeta que cantava a vida dos que o ouviam.

Com mais de setenta anos de vida, apenas este ano Sebastião teve um reconhecimento das "autoridades" da sua cidade por sua vida dedicada aos habitantes. O Carnaval da cidade levava seu nome, mas não lhe deram o palco principal. Foi um homenagem envergonhada por duas razões: primeiro porque demorou muito e quase chegava após a sua morte e, segundo, porque as tradições cultivadas pelos descendentes de negros, brancos pobres e índios - esse mundo mestiço e policromático - envergonham a elite econômica, de Goiana e do Brasil, que sempre viu o povo como escabelo para os seus pés.

Contra todas as perspectivas, Sebastião Grosso venceu: cresceu, formou família, fez-se poeta, colocou o seu povo como centro de sua vida e fez a história de Goiana mais alegre e mais bonita.

Peço a bênção a Sebastião Grosso, agora cantando coco com todos os santos de seu povo.

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