domingo, março 30, 2008

João Francisco de Souza - meu professor informal

Tão logo cheguei a Salvador recebi a lamentável notícia da norte de João Francisco de Souza, em Abrantes, município de Camaçari, na Bahia. Minha passagem por Salvador estava ligada à defesa da dissertação de mestrado de minha filha Ana Valéria, na Universidade Federal da Bahia. João Francisco estava em Camaçari para inaugurar um curso de Formação de Professores. Formar educadores, o grande objetivo de sua vida. Os motivos de alegria e tristeza se confundiram na paisagem baiana, como parte que da vida. Em um assalto, morreu vítima da violência um educador.

Conheci João Francisco ainda na minha adolescência, na segunda metade dos anos sessenta do século passado. João estava envolvido na organização do Encontro de Irmãos, um programa de evangelização da arquidiocese de Olinda e Recifem sob a liderança de Dom Hélder Câmara. João Francisco era um dos coordenadores daquelas Comunidades Eclesiais de Base, sistematizando as discussões e produzindo material que era utilizado nos grupos espalhados por toda arquidiocese. Especilamente nas áreas periféricas, pois as áreas centrais e engordadas com as riquezas carecem de sensibilidade para a Boa Nova.

Simultaneamente eu começava a organização de grupos de jovens na comunidade de Nova Descoberta, jovens ligados à Igreja Católica. Nas minhas andanças pelos bairros, visitando e conhecendo os grupos, pude sentir como João era querido por todos. O tempo passou e João Francisco iniciou a sua carreira acadêmica no Centro de Educação da UFPE. Seguidor de Paulo Freire, cujas diretrizes estavam tão presentes nas reuniões do Encontro de Irmãos e nas suas aulas, João foi chamado a participar na renovação educacional das escolas da Prefeitura da Cidade do Recife. Uma de suas maiores colaborações foi, acredito, o Projeto Teimosinho, para a Educação de Jovens e Adultos, quando ainda ele atuava como presidente da Fundação Educar, antigo Mobral, que se tornou depois a Diretoria de Educação de Jovens e Adultos da Secretaria de Educação do Recife, onde eu o substitui.

A ação de João Francisco ultrapassava os limites de sua cidade, vindo a se tornar Secretário de Educação de Jaboatão dos Guararapes, ao mesmo tempo em que assessorava os projetos de Educação de Adultos em vários países da América Latina e Caribe.

A educação, formal ou não formal, deve levar à libertação do educador e do educando. As estruturas de dominação e escravização dos homens e mulheres, sempre dispostas a impedir as possibilidades de realização dos anseios de liberdade, perseguem e procuram destruir aqueles que sonham e agem na direção da liberdade. No ano de 1973, no auge da ditadura militar, quando o ditador de plantão pugnava para acabar todas as resistências contra a desordem legal implantada desde 1964, João Francisco foi preso, tirado de sua casa, sob olhar atônito de sua esposa, Inês. Não foi ele o único a ser preso naquele difícil momento de nossa história, especialmente aqui no Recife. Impossibilitados de atingir diretamente a Dom Hélder Câmara, os ditadores e seus sequazes passaram a atacar os colaboradores do Arcebispo de Olinda e Recife, o DOM. Mas as igrejas lotaram em vigílias de oração por ele e por outro Francisco, o José, da ACO.

João Francisco de Souza, que sorria e abraçava com afetuosidade, gerou espaços de libertação para educandos e educadores que com ele puderam comunicar-se. Sua vida, com todas as contradições humanas foi, em sua maior parte, um hino à liberdade e à felicidade. Obrigado.

Um comentário:

Cybelle disse...

Olá, fui aluna e monitora do prof. João Francisco, li seu texto e fiquei emocionada por passarmos pela vida de uma pessoa única e inesquecível, que nos ensina para a vida.
Um forte abraço
Cybelle Carvalho