segunda-feira, fevereiro 23, 2009

Um Dom entre nós

Este artigo foi escrito especialmente para o Jornal Panorama da Mata Norte, da cidade de Goiana, PE. Foi publicado na edição do dia 19 de fevereiro, na página 09.






Todos os que acompanharam o noticiário nos diversos meios de comunicação na semana que terminou neste sábado 9 de fevereiro, em algum momento viu, leu ou ouviu algum comentário sobre o centenário do nascimento de Dom Hélder Câmara. Alguns devem ter se perguntado a razão para essas comemorações, e por que, entre tantos brasileiros, esse alvoroço em torno de um cearense, nascido no ano de 1909, e morreu aos noventa anos de idade, na cidade do Recife. Alguns levantaram questões, talvez com o objetivo de negar a validade de tais manifestações; outros exultaram ao saber e participar dos encontros que homenageavam e mantinham a sua memória, e outros apenas se perguntavam: quem é, ou quem foi esse Hélder Câmara?

Não é fácil, para qualquer pessoa, que tendo conhecido Dom Hélder Câmara, se aventurar a tecer comentário e escolher o que dizer a respeito de um padre que: publicou quase três dezenas de livros; produziu dezenas de pareceres sobre a educação quando foi membro do Conselho Nacional de Educação; foi Diretor de Educação do Ceará, Assistente Nacional da Ação Católica; idealizador e um dos fundadores da Conferência Nacional do Bispos do Brasil – CNBB; inspirador do Conselho Episcopal da América Latina – CELAM; Organizador dos encontros sobre a realidade do Nordeste e da Amazônia, que criaram o ambiente para a criação da Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste – SUDENE e a Superintendência da Amazônia – SUDAM; foi a Voz dos que não podiam falar durante a Ditadura Militar que dominou o Brasil entre 1964 e 1985; teve participação intensa no Concílio Ecumênico Vaticano II, de maneira a ser considerado um dos principais prelados daquele encontro convocado pelo Papa João XXIII; recebeu títulos de Doutor em universidades dos cinco continentes; foi indicado várias vezes para receber o prêmio Nobel da Paz ( e só não o recebeu porque o ditador Emílio Garraztazu Médici fez pressionou os responsáveis pela escolha); que tem suas obras estudadas, hoje em universidades do Japão e em países europeus. E poderíamos continuar citando tantas outras razões para nos gloriarmos de termos tido o privilégio de ter vivido em seu tempo.

O franzino Dom Hélder, que foi Arcebispo de Olinda e Recife entre os anos de 1964 e 1985, venha sendo alvo de tanta admiração do mundo por sua dedicação constante à melhoria de vida de todos os seres humanos, especialmente dos mais pobres.

Apaixonado pela vida, desde a sua juventude, decidiu ser padre para poder servir. A sua vida foi de um permanente serviço à causa da humanidade, à causa de Deus. Em sua juventude, participou do movimento integralista, como muitos outros jovens idealistas, idealistas como ele nos anos de 1930. Percebeu o engano que era o fascismo,mas continuou a buscar meios para encaminhar-se e encaminhar a sociedade para uma mundo melhor. Jamais perdeu o entusiasmo da juventude e sempre soube que os jovens, de todas as épocas, não admitem a mentira. A busca constante da verdade, não poder, não das honrarias, foi a caminhada de Dom Hélder. Ele sempre soube que é necessário vencer o egoísmo e a vaidade que tem produzido uma sociedade injusta, uma sociedade em que “os ricos ficam mais ricos e os pobres cada vez mais pobres”, a sua vida se tornou um compromisso pela superação da miséria. Uma vez ele disse que a “a maior e mais perigosa das bombas é a Bomba M, a bomba da Miséria”. Nessa convicção deu inicio à urbanização dos barracos das favelas cariocas, o que lhe trouxe a inimizade de muitos donos de terrenos guardados para a especulação imobiliária. Desde então passaram a lhe chamar de “bispo vermelho”, de “bispo comunista”. Quando assumiu a arquidiocese de Olinda e Recife, disse que no “Nordeste Cristo tem o nome de João, Francisco e Severino” se disse bispo de todos, mas especialmente dos mais pobres. Por isso, quando ocorreram a grande enchente do Rio Capibaribe, criou a Operação Esperança e estimulou a criação de Conselhos de Moradores e a organização dos pobres. Para Dom Hélder a solidariedade e a caridade não é apenas dar comida, mas auxiliar as pessoas a produzirem sua própria vida. “A eternidade começa aqui” enquanto se preocupava em encontrar meios de acabar com a miséria, pois, como costumava dizer, “saco vazio não de põe em pé”. Talvez por isso o papa João Paulo II, que deveria tê-lo feito cardeal, disse que Dom Hélder era o “irmão dos pobres”.

Deixou de viver no palácio e foi morar em uma pequena sacristia de uma igreja. Ali recebeu a intelectuais, ministros de Estados, bispos, pastores e de outras religiões, recebia a gente humilde, atendendo à porta e o telefone. Teve sua casa ameaçada, a sede da Arquidiocese metralhada, um dos seus padres – Antonio Henrique Pereira Neto - foi morto, vários padres e leigos que estavam mais próximos e empenhados nas atividades foram presos e torturados. Em todos esses momentos Dom Hélder foi o perdão e a firme confiança em Deus. Talvez por isso, aqueles que conviveram com ele deixaram de chama-lo de Dom Hélder, passaram a dizer Dom, simplesmente Dom, por que ele foi exatamente isso para todos: um DOM. Dom, do amor, da amizade, do perdão, da caridade, da coragem, da humildade, da fortaleza, da alegria.

Um comentário:

Anônimo disse...

BIu, excelete a sua matéria sobre Dom Hélder. A juventude de hoje precisaria conhecer mais a vida desse grande humanista, desse defensor dos pobres, menestral do AMOR e da Solidariedade. Assisti a um documentário, no qual você fala muito bem de toda caminhada do nosso Dom Hélder. Como poderíamos conseguir uma cópia desse DVd para usarmos em nossas aulas?
Um grande abraço e Parabéns!
Dodora