domingo, agosto 26, 2007

Usina Cultural

Ontem dia 25 de agosto, ocorreu uma pequena festividade na Chã de Camará, com presença de representantes do Ministério da Cultura, da EMPETUR, do Prefeito da cidade, do Presidente da Câmara Municipal de Aliança, dos Griôs do Ponto de Cultura Coco de Umbigada de Olinda, e os cinco maracatús do município de Aliança, homenageados com plaquetas alusivas ao Dia do Maracatu, que em Aliança é comemorado no 1º de agosto. Na ocasião foi apresentado o projeto arquitetônico do futuro centro cultural do Ponto de Cultura Estrela de Ouro, um trabalho doado pela arquiteta e urbanista de Renato Vilanova.
O texto abaixo foi escrito e dito por mim, como assessor pedagógico do Ponto de Cultura.


USINA CULTURAL


Os anos recentes anos vividos em Chã de Camará tem nos mostrado que as mudanças ocorrem em nossas vidas e ao nosso redor. A vida na área rural é monótona, seguindo o caminho do sol e os anos se repetindo. Muitas gerações passam e os netos vivem como os pais, ou ao menos pensam como eles. Nada parece mudar e imaginamos que não adianta pensar em ser ou fazer diferente. Mas se olharmos ao nosso redor podemos verificar que esse pedaço de terra conhecido antigamente como Três Vendas, como a entrada para Upatininga, cada vez mais vai sendo conhecido como Chã de Camará, o sítio onde está o Ponto de Cultura Estrela de Ouro, do Maracatu Estrela de Ouro de Aliança. Foi assim que a mudança começou a ocorrer. O Maracatu
Estrela de Ouro quis ser um Ponto de Cultura.

Um Ponto de Cultura é o lugar onde as pessoas se encontram para traçar experiências e fazer as artes que sabe, e transmitir as artes que sabem fazer.
Aqui as pessoas sempre fizeram cultura: agricultura, cultivo da terra para a produção de macaxeira, inhame, banana, batata, jerimum, além da atividade no plantio e corte da cana e na produção do açúcar nas usinas.

As usinas que dominam a vida de quase todos que aqui estão presentes, pois a maioria dos presentes têm gasto sua vida nos trabalhos desde a preparação da terra até a chegada da cana nas usinas, quase nunca se preocupam com os nossos espíritos. Nas usinas aprendemos que há mestres para muitas atividades e, fora delas muitos se tornaram mestres em atividades que não interessavam aos donos de engenhos e usinas produtoras de açúcar de cana. As usinas de açúcar ou álcool estão preocupadas na produção de uma riqueza material, necessária para a manutenção da vida.

Mas nós somos mais que matéria, e produzimos idéias, produzimos sonhos e novos objetivos da vida. Por isso o Ponto de Cultura Estrela de Ouro de Aliança começa hoje fazer funcionar uma outra usina, uma usina que preservará e produzirá a cultura imaterial, essa riqueza que recebemos de nossos avós, e parece que ninguém nós ensinou; é como que saída do nosso sangue, pois aprendemos olhando os nossos pais, nossos tios, nossos amigos. Nossa escola, onde aprendemos as tradições, tem sido os terreiros de nossas casas, nossas conversas, quando sentados nas raízes das jaqueiras, ou enquanto trabalhamos nos espaços dos engenhos e usinas.

O Ponto de Cultura Estrela de Ouro, cujo nome diz o que somos, já tem provocado essas mudanças que nossos olhos percebem, como essas novas casas que reavivam a paisagem da Chã de Camará, ao mesmo tempo em que inaugura moradias cidadãs; essa Usina Cultural será o local de produção e de registro daquilo que é produzido nessa região. Após esmagar a cana os engenhos faziam pão de açúcar, após anos de trabalho, será o momento de registrar as toadas de Mestre Mariano, os versos de Mestre Zé Duda, os sons dos ternos, dos bancos dos Cavalo Marinho, mestrado por Mariano Teles, das caixas e bombos da Ciranda, dos atabaques e pandeiros do Coco, sob a orientação do mestre Biu do Coco;. Além do registro, a Usina Cultural é o lugar de formar novos mestres, lugar de oficinas, de trabalho, de estudo, a Usina Cultural será o lugar de transferência e criação de novos saberes. Aberta a todas as pessoas, a Usina Cultural produzirá muitos frutos – mestres, músicas, danças, poesias – e será mantida por essa produção.

[1] Escrito para ser lido no lançamento da Usina Cultural do Ponto de Cultura Estrela de Ouro, na sede do Maracatu Estrela de Ouro de Aliança, no Sítio Chã de Camará.
[2] Professor adjunto do Departamento de História da UFPE, Assessor do Ponto de Cultura Estrela de Ouro.

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